Protesto em frente ao Palácio Guanabara denuncia despejo da Casa de Referência Almerinda Gama. A Casa já acolheu mais de 200 vítimas de violência doméstica.
Ana* procurou a Casa de Referência Almerinda Gama em desespero. Sua filha, de 10 anos, havia sido violentada por um adolescente próximo da família. O abuso só veio à tona uma semana depois, quando a menina se queixou de fortes dores no baixo ventre. Internada, precisou de tratamento emergencial para prevenir doenças e lidar com complicações físicas.
“Quem me conhece sabe que cuido bem dos meus filhos. Jamais imaginaria que algo assim pudesse acontecer dentro da minha casa”, disse Ana, aos prantos. Sem rede de apoio, perdeu temporariamente a guarda da filha.
Histórias como a dela atravessam os corredores da Almerinda Gama desde 2022, quando o espaço — fruto de uma ocupação organizada pelo Movimento Olga Benário — passou a funcionar como abrigo autogestionado para mulheres em situação de violência doméstica. Localizado na Rua da Carioca, 37, o prédio estava abandonado havia oito anos. Desde então, mais de 200 mulheres encontraram ali orientação jurídica, acompanhamento psicológico e apoio social oferecido por profissionais voluntárias.
Na quarta-feira, mulheres, crianças e idosas caminharam do Largo do Machado até o Palácio Guanabara, em Laranjeiras, para denunciar a ameaça de despejo do espaço. A prefeitura quer retomar o prédio para implantar o projeto “Rua da Cerveja”, anunciado em agosto pelo prefeito Eduardo Paes.
Em cima do carro de som, os relatos se alternavam: “Com baixo custo e serviços voluntários, mostramos que é possível oferecer ajuda real. O fator econômico não é só um deflagrador da violência, mas também o que mantém muitas mulheres presas nesse ciclo.”
O estado do Rio de Janeiro possui apenas três casas-abrigo públicas para mulheres vítimas de violência. A Almerinda Gama, com recursos limitados e sustentada pela solidariedade, tornou-se símbolo de resistência. O risco de seu fechamento escancara a precariedade das políticas públicas de proteção a mulheres em situação de vulnerabilidade.
*Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada.
